Exercícios poéticos, apaixonados e patéticos: pequenos mergulhos e vôos, para compartilhar...
9 de mai. de 2011
Asas na ilha...
Do crespo mar azul brancas gaivotas
Voam - de leite e neve o céu manchando,
E vão abrindo às regiões remotas
As asas, em silêncio, à tarde, e em bando.
Depois se perdem pelo espaço ignotas,
O ninho das estrelas procurando:
Cerras os cílios, com teu dedo notas
Que elas vêm outra vez o azul furando.
Uma na vaga buliçosa dorme,
Uma revoa em cima, outra mais baixo...
E ronca o abismo do oceano enorme...
Cai o sol, com já queimada facho...
Do lado oposto espia a noite informe...
Tu me perguntas se isto é belo?... e eu acho...
Luís Delfino
In 'Os Melhores Poemas'
1834/1910
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
(Cecília Meireles)
Pequena História do Nascimento do Mundo
O verbo se fez. Dizem que surgiu do hálito do homem, um sopro na terra. Antes da terra o homem, antes do homem o vento, antes do vento Idea que se fez verbo. Idea abriu os olhos para dar origem às coisas e pensou o mundo, a princípio, dividido em dois azuis: um azul de sombra e um azul de luz. Inventou a Morte e a Eternidade, a Caverna e a Inteligência. Idea, embora não soubesse, havia de separar o mundo em dois iguais. Disse: - Acima de mim as alturas, a região celeste. Fixou os astros. Para o céu pensou a Paz e todas as criaturas aladas, como um primeiro sopro da alma disse “Pássaro” e o som desta palavra trouxe o Vento.
(JACINEIDE TRAVASSOS.) * Trecho do texto
O Vento Vivendo na Casa
vento e mar talharam-se no meu corpo
cessar tua estação em mim foi impossível
sorvi o sumo que sopra nos ares a maresia
roubando-te estrelas marinhas para emprestar à noite
siderei-me no teu céu sem vestes
tingindo-me azul têmpora tronco e membro
colhi versos nos teus olhos
coisa pássara
pousados nos girassóis
violinos deitaram adágio sobre a terra de ti
casa de sementes imersas lírio e orvalho
(JACINEIDE TRAVASSOS)
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